O que NÃO é o tantra?
Na compreensão do que é tantra, também precisamos entender o que há de errado na sua reprodução
16|10|2024
- Alterado em 16|10|2024
Por Maria Chantal
O tantra vem ganhando cada vez mais notoriedade na internet, plataformas de streaming e programas de televisão. Muito porque o que vemos associado à prática é a promessa de um prazer transcendental, que, somado à expectativa de um orgasmo rápido, cria e promove equívocos. Por isso convidei duas terapeutas que conheço pessoal e profissionalmente para desmistificar alguns deles.
A terapeuta da técnica Maylana Irineu explica que, com a difusão de informações e práticas milenares do sul global, temas relacionados à sexualidade têm sido cada vez mais procurados. No entanto, pontua que “tantra não é sexo”. Segundo a pesquisadora, o tantra na verdade “utiliza da energia sexual para alcançar mais consciência, altos níveis ou níveis cósmicos de prazer e orgasmo”. Maylana ainda destaca que quem é terapeuta tântrica não faz sexo com clientes, atendem de roupas e usam luvas descartáveis. “Não é pornografia, muito menos prostituição”, reafirma.
Laisa Camargo, também terapeuta, complementa pontuando que tantra não é sobre sexo, nem sobre orgasmo. seu foco é na “expansão e liberdade, que conecta nossa potência e nos permite acessarmos memórias e percepções mais profundas de forma que o corpo não é visto como um obstáculo para nossa evolução, mas um canal para o processo de evolução individual.”
Para quem o Tantra é indicado?
Se até aqui já sabemos que o tantra é uma ferramenta para o seu processo de autoconhecimento, para quem então seria essa ferramenta? Maylana Irineu diz que “o tantra pode auxiliar todas as pessoas que se abram para essa experiência com coragem de entrar em contato com seu “self”, e despertar sua energia sexual de forma diferente do convencional. Tantra é um conhecimento mais profundo do que parece.”
Laisa, por sua vez, defende que todas as pessoas deveriam se permitir passar por esta experiência, mas em especial, a título de autoconhecimento, indica para quem “busca maior concentração, maior foco, para quem deseja expandir sua percepção de sentidos, para as pessoas que têm dificuldade de se sentir presente nos momentos de relaxamento e prazer, que acabam ficando muito em um lugar mental e ainda não compreendem como ouvir e sentir o que o corpo diz”.
Casais que queiram se conectar mais e para pessoas que precisam aprender a receber e para também estão na lista de indicações de Laisa quem busca maior conexão com o mundo a sua volta.
Clinicamente falando, Laisa conta que o tantra é uma terapia corporal integrativa que complementa tratamentos clínico e psicológicos, tratando traumas e bloqueios emocionais; disfunções sexuais como anorgasmia (dificuldade de atingir o orgasmo), desejo sexual hipoativo (baixa libido), ressecamento vaginal (dificuldade de lubrificação), dispareunia (dor durante a penetração) e vaginismo (disfunção caracterizada por contração intensa e involuntária do canal vaginal), disfunção erétil, ejaculação precoce, entre outras.
“Posso afirmar que não é um caminho só de prazer, é um caminho profundo de despertar energético, liberação de dores e traumas, conhecimento profundo das emoções e um trabalho profundo espiritualmente também” diz.
Maylana completa que para isso é preciso confiar na experiência e no terapeuta.. “Às vezes pode levar um tempo, às vezes pode ser bastante resolutivo e rápido. Cada experiência é única, pois cada ser é único.”
Falar sobre a expansão da energia vital, sexualidade e autoconhecimento sempre me remete ao texto da escritora Audre Lorde, Os usos do erótico: O erótico como poder. Em um de meus trechos preferidos, ela diz: “O erótico é um lugar entre a incipiente consciência de nosso próprio ser e o caos de nossos sentimentos mais fortes. É um senso íntimo de satisfação o qual, uma vez que tenhamos vivido, sabemos que podemos almejar. Porque uma vez tendo vivido a completude dessa profundidade de sentimento e reconhecido seu poder, não podemos, por nossa honra e respeito próprio, exigir menos que isso de nós mesmas.”
O que pode ser colocado sobre o quanto experimentar a sua própria energia vital e sexualidade, te abre portas para o autoconhecimento real e em níveis viscerais, além de mostrar a sua própria força e fundamentar os valores inegociáveis para a sua experiência humana.
Maylana compartilha que ao longo dos seus 15 anos de atuação como instrutora e Terapeuta Tântrica, atende pessoas que buscavam se conectar com o próprio corpo/corpa, até aquelas que tinham queixas sexuais ou haviam experienciado abusos sexuais. “ Quando eu vivi a primeira meditação tântrica, em 2009, estava vivendo um momento de dor e tristeza aguda, mudança de cidade, término de relacionamento, estava desacreditada de mim mesma. Não me achava bonita. Estava sem perspectiva. Já no primeiro dia de Práticas de Meditação, eu já notei a diferença, me senti viva por dentro”.
Para quem não é o Tantra
Desmistificar a massagem tântrica é também desfazer a crença de que todos estão preparados e podem acessar. A terapeuta Laísa Camargo traz as definições de contra indicações gerais:
Menores de 18 anos
Gestantes no primeiro trimestre
Estar com alguma infecção, IST que esteja em fase ativa (com ferida/dor) ou febre
Epilepsia/convulsões (sem liberação médica devidamente sinalizada)
Câncer recém-diagnosticado
Recomendações finais
Laís conclui que a prática possui algumas vertentes que podem ser adaptadas para o que a pessoa busca. “ O mais importante é sempre buscar por referências sérias, que respeitem sua história, corpo e limites”.
Maylane complementa que o tantra é sobre aceitação e transformação.”Mas digo também que Tantra não faz nada só, outras terapias são complementares.”
Esse texto é a continuação da coluna “Tantra – muito além do orgasmo transcendental“. Para se aprofundar ainda mais, leia ela aqui
Maria Chantal Maria Chantal é uma mulher cis, bissexual, angolana em diáspora no Brasil. Estudiosa autodidata da Ginecologia Natural, atua como educadora menstrual, compartilhando conhecimentos sobre prazer, rebolado afro referenciados e a naturalização do ciclo uterino.
Os artigos publicados pelas colunistas são de responsabilidade exclusiva das autoras e não representam necessariamente as ideias ou opiniões do Nós, mulheres da periferia.
Larissa Larc é jornalista e autora dos livros "Tálamo" e "Vem Cá: Vamos Conversar Sobre a Saúde Sexual de Lésbicas e Bissexuais". Colaborou com reportagens para Yahoo, Nova Escola, Agência Mural de Jornalismo das Periferias e Ponte Jornalismo.
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